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terça-feira, janeiro 29, 2008

Toada de Portalegre Moderna

Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Morei na 62, casa velha,
À qual não quis como se fora
Feita para eu Morar nela...
Cheia dos maus olhares e maus cheiros
Das casas onde se faz história,
Sexo, paginações e vive escória
Cheia de tédio, e morta, enojante memória
De antigas e retrógradas gentes traças.
Cheia de sol nas vidraças
Partidas e escuro nos recantos,
Cheia de medo e surpresa,
De silêncios e de espantos,
- Quis-lhe como se fora
Tão feita ao gosto de agora
Como as do meu desassossego.
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De obras e de desencantos
Ao açoriano queimada
(Lá vem o velho açoriano!,
Que enche o sono de pavores,
Faz febre, esfarela os ossos,
E atira aos desesperados
A corda com que se enforcam
Na trave de algum desvão...)
Em Portalegre, dizia,
Cidade onde então sofria
(e agora ainda sofro)
Coisa que terei pudor
De contar seja a quem fôr,
Na tal casa tosca e bela
À qual não quis como se fora
Feita para eu morar nela,
Tinha, então,
Por única diversão,
Uma pequena varanda
Diante de uma janela
Toda aberta à rua 5 de outubro
Ao frio que tosse e gela
E ao vento que anda, desanda,
E sarabanda, e ciranda
Derredor da minha casa,
Caiam outras casas
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos e sobreiros
Era uma bela varanda,
Naquela bela janela!
Serras deitadas nas nuvens,
Vagas e zuis de distância,
Azuis, cinzentas, lilases,
Já roxas quando mais perto,
Campos verdes e amarelos,
Salpicados de oliveiras,
E que o frio, ao vir, despia,
Rasava, unia
Num mesmo ar de deserto
Ou de longínquas geleiras,
Céus que lá em cima, estrelados,
Boiando em lua, ou fechados
Nos seus turbilhões de trevas,
Pareciam engolir-me
Quando, fitando-me a Mia
Suspensa daquele silêncio imenso,
Sentia o chão a fugir-me,
E caia à chapelaria
- Se abriam diante dela
Daquela
Bela
Varanda
Daquela
Minha
Janela,
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Na casa em que morei, 62, velha,
Cheia dos maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
À qual quis como se fora
Tão feita ao gosto de outrora
Como as do meu aconchego...
Ora agora,
Que havia o Paulinho
Que enche o sono de pavores,
Faz febre, esfarela os ossos,
Dói nos peitos sufocados,
E atira aos desesperados
A corda com que se enforcam
Na trave de algum desvão,
Que havia o Preview
De se lembrar de fazer?
Em Portalegre, dizia,
Cidade onde então sofria
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for,
Que havia o Jimmy
De fazer,
Senão trazer
Àquela
Minha
Varanda
Daquela
Minha
Janela,
O documento maior
De que sugidade
e sugidade
Dos seus
Que mais faz sofrer?
Lá numa plantinha, que eu tinha,
Onde um odor perfumado
no sótão desarrumado
Mal dava THC sem vida,
Poisou qualquer sementinha
Que o vento que anda, desanda,
E sarabanda, e ciranda,
Achara no ar perdida,
Errando entre terra e céus...,
E, louvado seja Deus!,
Eis que uma folha miudinha
Rompeu, cresceu, recortada,
Furando a cepa cansada
Que dava alegria e vida
aquela
Bela
Casa
Aquela
Minha
Janela
Da 62 tosca e bela
À qual quis como se fora
Feita para eu morar nela...
Como é que o Rocco
Que enche o sono de pavores,
Faz febre, esfarela os ossos,
Dói nos peitos sufocados,
E atira aos desesperados
A corda com que se enforcam
Na trave de algum desvão,
Me trouxe a mim que, dizia,
Em Portalegre sofria
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for,
Me trouxe a mim aquela mortalha,
Esse cachimbo de paz
Dum aroma que fere... e consola
Como o próprio mal que faz?
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for
Me davam então tal vida
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros,
Me davam então tal vida
- Não vivida!, sim morrida
No tédio e no desespero,
No espanto e na solidão,
Que a corda dos derradeiros
Desejos dos desgraçados
Por noites de tais charrados
Já várias vezes tentara
Meus dedos verdes suados...
Senão quando o amor de Deus
Ao vento que anda, desanda,
E sarabanda, e ciranda,
Confia uma sementinha
Perdida entre terra e ceús,
E o vento a trás à varanda
Daquela
Minha
Janela
Da tal casa tôsca e bela
À qual quis como se fôra
Feita para eu morar nela!
Lá na plantação que eu tinha,
Onde uma planta cansada
Mal dava THC sem vida,
Nasceu essa canabizinha
Que depois foi transplantada
E cresceu; Dom do meu Deus!,
Aos pés lá da estranha casa
Da rua 5 de Outubro,
Frente ao comércio que em frente
Mostram erros,
Como dedos apontados
De gigantes enterrados...
Quem desespera dos homens,
Se a alma lhe não secou,
A tudo transfere a esperança
Que a humanidade frustrou:
E é capaz de amar as plantas,
De violar os animais,
De humanizar coisas brutas,
E ter criancices tais,
Tais e tantas!,
Que será bom ter pudor
De as contar seja a quem for!
O amor, a amizade, e quantos
Mais sonhos de oiro eu sonhara,
Bens deste mundo!, que o mundo
Me levara
De tal maneira me tinham,
Ao fugir-me,
Deixando só, nulo, vácuos,
A mim que tanto esperava
Ser fiel,
E forte,
E firme,
E hirto!
Que não era mais que morte
A vida que então vivia,
Auto-cadáver...
E era então que sucedia
Que em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Aos pés lá da 62
Cheia dos maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
- A minha planta crescia.
Penha!, obrigado...
Pela doce companhia
Que em teu hálito empestado
Sem eu sonhar, me chegara!
E a cada raminho novo
Que a tenra planta deitava,
Será loucura!..., mas era
Uma alegria
Na longa e negra apatia
Daquela miséria extrema
Na casa
Em que vivia,
E vivera,
Como se fizera um poema,
Ou se um filho me nascera.

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